Elas não pertencem à nenhuma companhia de dança, têm mais de 60 anos, estão ainda na fase de ‘namoro’ com a barra e as sapatilhas, mas se esmeram nos movimentos. Atentas ao ritmo da música que toca ao fundo, ensaiam, há seis meses, os primeiros passos no bal. Nos testemunhos, uma confissão: estão realizando, na maturidade, um sonho que tinham na infância, mas que por motivos diversos não conseguiram concretizar.
O grupo, exclusivamente formado por mulheres, comparece às aulas da professora Suzana Bayona, que comanda, na capital paulista, o espaço CorporeSer – cuja proposta é criar sintonia entre dança, movimento e saúde. Ela, que tem como primeira formação a psicologia e o balé clássico e posterior graduação em dança contemporânea e moderna, caminha pela sala com a suavidade e graça típicas de bailarina. Reconhece que se trata de um tipo de dança muito tradicional, secular e que se depara com preconceito e com o imperativo da perfeição”. Entretanto, assinala que não há porque ser exigente e rígida com quem está dando os primeiros passos. Ao contrário, o que se pretende com o grupo das longevas é olhar a singularidade, oferecer algo prazeroso e feito com o coração, afastando qualquer tipo de empecilho para as aspirantes.
O método que adota respeita o tempo e histórico de corpo de cada uma, levando em conta que a interação durante as aulas auxilia a escuta sobre as demandas individuais. “Não é para ser fácil e nem impossível”, considera. Entre os benefícios, que a sequência de exercícios proporciona, estão: alinhamento de postura, equilíbrio, fortalecimento de pernas, mobilidade das articulações, organização espacial, consciência de ritmo, coordenação motora, treino da atenção, exercício mental e sociabilização. “Dançar é fazer uma meditação em movimento”, sintetiza Suzana.
Balé, muito além da dança
Neli Araújo, 71 anos, professora de inglês aposentada, que integra a turma do CorporeSer, conta que a sua motivação é antiga, porque desejava ter frequentado aulas de balé quando criança. Concentrada durante a aula, ela destaca os avanços com o equilíbrio e a coordenação motora, cuidado terapêutico especialmente depois de um micro AVC, do qual foi vítima há 8 anos.
Por sua vez, Lúcia Paparella, 62 anos, formada em artes plásticas mas que sempre atuou na vida profissional como executiva da área jurídica de empresa, que também já pendurou a chuteira é entusiasmada com as aulas. Descontraída e com bom humor durante os exercícios recorda que, logo no primeiro dia, comunicou à professora que não estava familiarizada com a dança e havia um ponto que ela julgava ser um problema: estar acima do peso. Encorajada pela mestra, passou a acreditar que tudo daria certo dali em diante. E sobre o ganho emocional: “estou realizando um sonho infantil de fazer balé e, além disso, consigo administrar melhor meu alto grau de ansiedade”. Com pleno apoio do marido e filhos, que torcem pela sua evolução, Lucia arrisca: “eu brinco com a Suzana que nós ainda vamos nos apresentar no Teatro Municipal”.
Em sua essência, as aulas “melhoram o sentido da vida”, enfatiza a aluna Vanilda Costa, de 61 anos, professora aposentada. Revela que sempre acreditou na mescla de educação corporal e intelectual, “porque fortalece nosso desenvolvimento e é libertadora, à medida em que respeita nosso corpo, nossos limites e amplia as perspectivas pessoais”. Complementa que, apesar de longe dos clichês e dos rótulos de bailarina, “estamos virando a chave”.