Comportamento

O tempo das coisas leves

Por: Dal Marcondes*

O tempo é nosso mais importante patrimônio. Quanto mais acumulamos, mais trocamos por experiências, prazeres, amores ou mesmo decepções. Afinal, nem tudo pode dar super certo. Também, é o tempo que tudo cura. Quando somos jovens queremos acelerar o tempo, correr e experimentar tudo praticamente sem saborear. É quando nosso tempo é infinito e podemos ser perdulários. Haverá muito tempo depois…

Quando atravessamos a faixa da maturidade adulta, nosso tempo não mais nos pertence. Temos coisas a fazer, trabalhos a realizar, contas a pagar, filhos para criar. O tempo escoa por nossos dedos tal qual água em um riacho. Nessa idade temos o viço da juventude e os deveres de cuidadores universais.

Aos 50, nos damos conta de que meio século se passou quase sem percebermos. Olhamos para trás e vemos um tanto de coisas que desejamos e não fizemos e, olhamos para a frente e vemos que talvez não dê tempo, e tentamos acelerar o passo.

Enfim, chegamos aos 60. O tempo da lucidez, ao menos para alguns. Percebemos que muito do que desejamos não tem mais a menor importância e que muitas das coisas às quais nunca demos o menor valor assumem uma importância vital. Enfim, o tempo volta a nos pertencer.

O passado torna-se uma nostalgia que nos acalenta, e o futuro… ah, o futuro não é mais nosso, mas sim dos filhos e netos que lá viverão. Esse deve ser o tempo das coisas leves, isso não significa, no entanto, que o trabalho acabou. O tempo nos deu uma carga de experiências e conhecimentos que não pode ficar simplesmente estocada. É preciso passar à frente.

Essa carga de informações e contextos nos permite olhar para o presente. Talvez seja nesse tempo que temos a melhor visão do presente. Podemos olhar em volta sem a necessidade de correr para fazer outra coisa. Entender os contextos e oferecer o melhor conselho, para que o futuro seja mais confortável.

Nesse novo tempo podemos nos mover em direção à utopia do futuro. Isso significa que nosso melhor trabalho não é mais para o benefício pessoal. É para que os que vem depois de nós.  Finalmente realizamos o fato de que o mundo não começou quando nascemos e nem vai terminar quando morrermos. 

Depois dos 60 olhamos em volta e começamos a perceber que deixaremos um legado para os que viverão mais e para os que virão depois. É nesse tempo que nos deparamos com o que nos descuidamos e o que precisamos consertar e regenerar. Percebemos o quanto fomos omissos com nosso único lar no universo.

A vida é, em princípio, uma utopia realizada. Olhamos em volta e percebemos que é preciso usar o que aprendemos para preservar, regenerar e tornar nosso legado o melhor possível. Estar vivo é o grande milagre do universo. Com toda a ciência e tecnologias do nosso tempo ainda não encontramos nenhuma forma de vida em lugar algum desse imenso universo. Só aqui. E isso deve nos dizer algo.

 * Dal Marcondes é jornalista com experiência em comunicação socioambiental e desenvolvimento sustentável. Diretor da Envolverde, agência de notícias especializada em meio ambiente, tem se dedicado a questões urgentes como a crise climática, a economia verde e a justiça ambiental, contribuindo para o debate público. Sua atuação vai além do jornalismo, envolvendo também pesquisa e defesa de políticas públicas alinhadas a um futuro mais equitativo e sustentável.

Foto: Acervo pessoal

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