Por: Maurício Mellone*
Tarde de sábado chuvosa, com um friozinho do outono paulistano, fui surpreendido na academia com uma pergunta vinda de um garoto:
– É bom ser adulto?
Depois de uma bela risada, respondi perguntando:
– Mas não é bom ser criança?
O garoto, muito falante e desembaraçado para os seus pouco mais de 10 anos, respondeu divagando que ser adulto “deve ser muito bom!”
Novamente devolvo a bola, perguntando o porquê. Ele mais do que depressa responde:
– Por que não precisa mais estudar!
Rio novamente e digo que adulto não precisa mesmo mais estudar, mas precisa trabalhar. Sem rodeios ou qualquer dificuldade para rebater-me, o menino diz que para ele não vai ser nada chato trabalhar, pois será um cantor.
Ensimesmado, pude rir muito com o garoto, que logo estava pronto para ir embora, mas fez questão de perguntar meu nome. Disse com naturalidade e agora era ele que caía na gargalhada. Pergunto por que estava rindo e ele me diz:
– Esse é o nome do meu pai!
Não podia deixar que fosse embora sem saber seu nome. Ele diz com belo sorriso no rosto:
– Nicolas, e se despede educadamente, demonstrando mais uma vez que no fundo tem muito mais experiência de vida do que aparenta sua idade cronológica.
Depois desse agradável diálogo, voltei-me para minhas reflexões. Tinha acabado de sair da piscina, de um treinamento regular auto imposto, justamente na semana em que mais um sinal dos anos acumulados nas costas tinha aparecido na minha vida. Depois de meses monitorando o funcionamento irregular da tireoide, minha médica havia receitado o medicamento que irá me acompanhar pelo resto de meus dias!
Com o compromisso de me manter saudável e com o mínimo de controle sobre a crise dos “enta”, fui pego de calças curtas pelo Nicolas!
Se estou preocupado em envelhecer, ou pelo menos chegar sem solavancos à tal da melhor idade – mantenho rígido controle alimentar, bebidas alcoólicas só com moderação, além da prática regular de exercícios físicos – o garoto sonha
de olhos abertos com a vida adulta! Alegre ironia! Só mesmo o poeta para me tirar desse beco com infindáveis saídas! Fui correndo ouvir a canção de Carlos Renó, brilhantemente interpretada por Ney Matogrosso, Lema:
“Envelhecer
Certamente com a mente sã
Me renovando
Dia a dia, a cada manhã
Tendo prazer
Me mantendo com o corpo são
Eis o meu lema
Meu emblema, eis o meu refrão”.
Nicolas, ser adulto é saber envelhecer. Vamos juntos chegar lá?
* Maurício Mellone é jornalista profissional e já atuou em quase todas as mídias. Na impressa (jornais e revistas), foi revisor, repórter, subeditor e editor; em rádio, foi produtor de programa e, na TV, redator. Autor de peça teatral, poesias, crônicas e contos. Desde 2010, mantém seu blog Favo do Mellone onde ressalta em resenhas a rica e extensa programação da cidade de São Paulo: teatro, cinema, música, dança, literatura e artes plásticas, além de postar vídeos com comentários, entrevistas e dicas das produções culturais.
Ilustração: Ricardo Castro