Por Fernando Porto Fernandes*
Era uma cena corriqueira pelos corredores da U.T.I. do Hospital Dom Alvarenga, no bairro do Ipiranga, em São Paulo. Psicólogas hospitalares, junto com estagiários, passavam pelos quartos dos pacientes e faziam a mesma pergunta: “Boa tarde! Gostaria da visita do “Patas” amanhã?”. Alguns que já sabiam do que se tratava, balançavam a cabeça afirmativamente com um sorriso no rosto. Quem estava há pouco tempo internado recebia uma breve explicação da atividade. Aos pacientes que concordavam, os profissionais fixavam uma plaquinha com a foto de um cão meigo na porta do quarto, sinalizando o desejo da visita do amigo pet.
“Será que eu posso receber a visita do meu pequenino, que está em casa?”, perguntou uma senhora de óculos grossos, deitada em um dos leitos. “Infelizmente, não é possível desta vez”, respondeu a psicóloga. “Ele precisaria passar primeiramente pelo serviço de controle de infecção hospitalar”, explicou. Com um semblante triste e conformado, a paciente balançou a cabeça em sinal de aprovação da visita dos pets treinados pela instituição. No dia seguinte, presenciei a chegada do grupo de adoráveis cães no hospital – alguns de raça, como Golden Retriever, Spitz Alemão, e outros sem raça definida. Na chegada dos pets aos quartos, impossível não se emocionar com os sorrisos abertos dos pacientes.
Projetos fantásticos, como o da ONG de voluntários Patas Therapeutas* (patastherapeutas.org), da chamada Terapia Assistida por Animais (TAA), não só têm aliviado a dor de pacientes terminais de todas as idades, mas são também mais uma prova concreta de que o convívio com animais domésticos – cães, gatos, pássaros e outras espécies – pode contribuir para uma vida mais saudável, principalmente para as pessoas 60+. E mais um benefício: esse tipo de tratamento também diminui sintomas psíquicos das pessoas no ambiente hospitalar.
Alívio da dor e dos sintomas
Em 2022, a Escola de Saúde Pública da Universidade de Saskatchewan realizou um estudo controlado sobre a TAA no Canadá que comprovou uma relação significativa entre cães de terapia e a melhora da saúde mental em pacientes do setor de emergência. Segundo os pesquisadores, bastava passar somente dez minutos na companhia de cães de terapia para que diminuísse consideravelmente a dor de pacientes com câncer e de outras enfermidades, além de reduzir os sintomas em quadros de ansiedade e depressão.
Outros estudos sobre o impacto fisiológico dos animais de estimação indicam que a presença de cães e gatos pode ajudar a reduzir os níveis de cortisol (hormônio do estresse) e aumentar a liberação, pelo hipotálamo, de ocitocina (popularmente conhecida como hormônio e neurotransmissor do amor), promovendo uma sensação de relaxamento e bem-estar. O contato com esses bichos pode aumentar também a produção de um analgésico natural, a endorfina, e também de serotonina – o neurotransmissor que regula por meio das sinapses neurais o humor, o sono e o apetite.
No meu trabalho no setting terapêutico, tenho observado a melhora de alguns pacientes após adotarem um cão ou um gato. Curiosamente, há uma significativa procura pelos felinos – considerados mais independentes, sem deixarem de ser carinhosos, apesar do senso comum questionar sua sensibilidade.
A famosa psiquiatra junguiana Nise da Silveira, que foi retratada no ótimo filme homônimo sobre seu trabalho em um hospital psiquiátrico, chegou a escrever um livro sobre os felinos e seu poder terapêutico, chamado “Gatos, a Emoção de Lidar”, publicado em 1998. Na obra, ela fala sobre a relação dos gatos com a literatura, as artes, os sonhos e seu simbolismo. “Desprezo as pessoas que se julgam superiores aos animais. Os animais têm a sabedoria da natureza”, escreveu ela, que chegou a permitir cães e gatos para convívio com pacientes com quadros psicóticos.
Conexão emocional com os 60+
Estudos de 2019, e durante o pico da pandemia, destacaram que interações com animais podem reduzir os sentimentos de solidão em pessoas 60+, promovendo a conexão emocional. Além de serem uma fonte confiável de apoio afetivo, melhorando a qualidade de vida, os pets podem ainda fomentar o convívio social, já que muitos tutores, especialmente os de cães, tendem a sair mais de casa para passeios e interações com outros donos de animais.
Vários estudos, como um publicado em 2020, na revista Psychiatry Research, apontam que a adoção de pets pode reduzir sintomas de depressão no período da senescência, principalmente devido ao aumento do relacionamento social e à redução do estresse. Uma pesquisa divulgada também em 2020 no Journal of Applied Gerontology revelou que pessoas da terceira idade que possuem animais de estimação apresentam níveis mais baixos de estresse e melhor saúde mental em comparação com aquelas que não têm.
Ter um pet também pode proporcionar aos idosos uma sensação de propósito e responsabilidade, especialmente ao cuidar das necessidades de um animal. A rotina de alimentar, exercitar e cuidar de um pet pode melhorar a autoestima, pois os idosos sentem-se úteis e engajados.
Apesar dos vários benefícios do convívio com um animal doméstico, são necessários alguns cuidados. Pessoas com maior limitação física devem evitar a adoção de cães grandes ou com histórico de agressividade, pois podem sofrer quedas em algum solavanco inesperado da guia do animal em alguma perseguição a outro cão na rua. Deve-se também, no caso de filhote, ter a certeza do porte pequeno dos pais do pet a ser adotado.Isso vale para a checagem rigorosa da procedência de gatos já crescidos, evitando aqueles com histórico de agressividade ou fugas constantes.Recomenda-se procurar sempre instituições de séria reputação, que garantam animais já castrados. Vale lembrar também que cães vivem em média de 10 a 15 anos e felinos de 14 a 20 anos, e os maiores custos da criação ocorrem quando há necessidade de cuidados veterinários (já existem atualmente até planos de saúde para pets).
Como última recomendação, é importante, antes de adquirir o animal, consultar a opinião de um médico, no caso de a pessoa possuir doença crônica, ou um profissional da saúde mental – psiquiatra ou psicólogo – em casos de transtornos psíquicos diagnosticados e não tratados.
Se forem tomadas todas essas precauções, virá a grande recompensa: um companheiro que trará muito amor e inúmeras alegrias à sua vida. Como tutor de pet, isso eu posso garantir!

*Fernando Porto Fernandes é psicólogo clínico, escritor e jornalista.
@fernandoportof.psicologo
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